domingo, 25 de fevereiro de 2018
sábado, 17 de fevereiro de 2018
Conheça Joyce Muniz - DJ e produtora brasileira que conquistou o Kraftwerk
A entrevista foi originalmente publicada no site Music Non-Stop, e como todos nós sabemos, Ralf não gosta muito de que utilizem músicas do Kraftwerk sem a sua autorização, mas parece que dessa vez, o Sr. Hütter abriu uma grande exceção.
Confira abaixo a entrevista com a DJ e produtora brasileira Joyce Muniz.
Joyce Muniz é a DJ e produtora
brasileira que mora na Áustria e já ganhou até bênção do Kraftwerk. Conheça!
Ela tem nome de cantora de bossa nova, mas não se
engane! A brasileira Joyce Muniz, radicada há 20 anos em
Viena, Áustria, vem se confirmando como um dos grandes nomes da música
eletrônica mundial, com faixas sendo consumidas e tocadas nos quatro cantos do
planeta. Joyce inclusive é das poucas produtoras no mundo a poder dizer de boca
cheia que teve uma música com sample do Kraftwerk
aprovada pelo próprio Ralf Hütter, um dos criadores do
grupo mais importante da história da música eletrônica – quiça da música pop
também.
Quando se mudou para Viena, então com 12 anos de
idade, Joyce nem sonhava com música eletrônica, porém sua nova pátria vivia um
período fértil nesse departamento. Nomes como o da dupla Kruder &
Dorfmeister estavam no auge de sua forma. Estamos falando de
1997/1998, momento em que a música eletrônica viveu um flerte intenso com
gêneros como o jazz, o soul, o hip hop e a música brasileira. Desse cruzamento
veio o downtempo, que naquele momento também ganhou o nome de easy listening, e
a Áustria teve sua parcela de culpa nesse boom, com artistas como Tosca
– projeto paralelo de Richard Dorfmeister – e o selo G-stone,
lançado pelos próprios Kruder & Dorfmeister, endereço
certo pra achar boa música com essa pegada mais “dá um tempo”.
Mas isso era só a ponta do iceberg. A cena
eletrônica austríaca fervilhava em diferentes BPMs. De raves de psy a grandes
clubes, passando por uma importante cena de drum’n’bass, que foi a porta de
entrada de Joyce na cena local. ” Foi numa festa em Viena, em 1998, quando
eu fui ver pela primeira vez o DJ Grooverider, um dos pioneiros do drum’n’bass.
Não só a música, mas a energia das pessoas e como elas absorviam o som. Isso me
fascinou; como uma pessoa sozinha tinha o poder de comandar uma pista cheia,
daquele jeito, e fazer tanta gente feliz. Pensei: ‘eu também quero'”, diz Joyce
em entrevista à coluna #MillerMusic.
Corta para 2016. Joyce lança Made in Viena,
seu primeiro álbum pelo selo Exploited. Com tracks que viraram hinos, como Back
in The Days, a tal música abençoada pelo Kraftwerk, o
disco marca um novo salto na carreira da produtora. O disco, que tem várias
participações, tem um brilho especial, que não passou batido por DJs e
produtores por este mundão afora. Ouça.
Como ela saltou da pista para o
comando dos toca-discos e daí para se tornar headliner de tantas festas e
festivais legais pelo mundo? Você fica sabendo agora. Mas antes dá um play
neste set que ela gravou no clube Egg, em Londres, em abril deste ano.
Music Non Stop – Você saiu do
Brasil aos 12 anos. Como você vê o Brasil sendo quase uma gringa hoje em dia?
Joyce Muniz – Em termos de
musica eletrônica, eu acho que o Brasil evoluiu muito. Antigamente existiam os
clubes nas grandes cidades e as famosas raves de psy. Hoje em dia, existem
vários grupos e coletivos que produzem várias festas ligadas ao underground
eletrônico, e eu acho que isso abriu as portas para a nova geração. A internet
também ajuda muito a dar acesso a novos gêneros da música eletrônica, não só
techno ou house, mas também abriu as portas para o abstracto.
Music Non Stop – Você foi pra
Viena mais de 20 anos atrás. Estava vendo no Vinyl Sessions
que você abriu o programa com Follow Me, do Aly Us,
que foi clássica em clubes de SP como o Hell’s. Como foi sua formação na música
eletrônica, começou aqui ou você se ligou nisso em Viena?
Joyce Muniz – Eu saí do Brasil
aos 12 anos de idade e na época eu não tinha nenhuma ligação com a música
eletrônica. Quando eu me mudei pra Viena, a cidade estava vivendo o auge da
música eletrônica. Não tinha como fugir e Follow Me não foi só um hit
no Brasil, mas foi um hit internacional na cena house music.
Music Non Stop – Você se lembra
quando foi a primeira vez que teve vontade de ser DJ? Viu alguém tocando que te
inspirou ao vivo ou na TV?
Joyce Muniz – Eu nunca vou me
esquecer, foi em uma festa em uma fábrica abandonada em Viena em 1998, quando
eu fui ver, pela primeira vez, o DJ Grooverider, um dos
pioneiros do drum’n’bass. Não só a música, mas a energia das pessoas e como
elas absorviam o som. E isso me fascinou. Como uma pessoa sozinha tinha o poder
de comandar uma pista cheia, daquele jeito, e fazer tanta gente feliz. Eu
pensei: “também quero”. Mas uma das inspirações que realmente me ajudaram muito
foi quando o meu melhor amigo e vizinho, Andy, comprou um
setup de DJ, e isso acabou virando a nossa escolinha de reforço.
Music Non Stop – Você começou
tocando jungle e drum’n’bass com 15, 16 anos… imaginava que isso poderia se
tornar uma profissão?
Joyce Muniz – Eu não imaginava
que isso seria a minha profissão quando comecei, era mais um hobby. Naquela
época, ser DJ não era visto como uma boa profissão, mas eu sabia que seria
difícil largar.
Music Non Stop – Rolou uma
conexão Brasil lá em Viena, você buscou nos seus conterrâneos um porto
seguro ou nunca teve isso?
Joyce Muniz – No início da minha
carreira como DJ não existia uma conexão entre Brasil e Viena pra mim. Mas eu
me lembro, depois de alguns anos que eu já estava tocando, de ter ido ao Brasil
para visitar familiares e pude ver que já existia uma cena de musica de
eletrônica em São Paulo, e foi aí que eu comecei a me conectar com as pessoas.
Na época, eu tinha uns 19 anos e eu conheci pessoas maravilhosas que viraram
minhas amigas.
Music Non Stop – Você começou
tocando no Dub Club em Viena aos 17 anos. Você já a partir daí assumiu DJing
como profissão? Chegou a seguir com estudos “normais”?
Joyce Muniz – Na verdade, levou
alguns anos para eu assumir a profissão de DJ. Demoraram alguns anos para eu me
estabilizar na cena e ganhar algumas residências na cidade. A partir do momento
em que a minha mãe viu que o meu hobby era algo que eu gostaria de seguir
profissionalmente e o que realmente me deixava feliz, ela me apoiou, mas queria
que eu terminasse os meus estudos. Eu estudei Hotelaria e Turismo em Viena. Eu
até tentei seguir o ramo, mas o que fazia meu coração vibrar era tocar.
Music Non Stop – Sua mãe tinha
discos de MPB e é muito festeira. Conta um pouco sobre a influência dela na sua
formação, por favor.
Joyce Muniz – A minha mãe foi
uma grande influência para mim, não só na música, mas como um exemplo de
mulher, de tomar as decisões certas e nos momentos certos, como finalizar os
estudos, por exemplo. Ela sempre gostou de música e de festa, mesmo morando na
Áustria sempre rolava festa em casa. Quando eu comprei os meus primeiros
toca-discos, ela me presenteou com a coleção dela de discos de MPB, que é
enorme e eu guardo com muito carinho. Um dia eu ainda vou poder passar para os
meus filhos futuramente
Music Non Stop – Você viu Marky
e Patife tocando em Viena. Como era ser brasileira e estar na
pista deles nessa época?
Joyce Muniz – Foi uma época
muito inesquecível para mim e para todas as pessoas que estavam presentes. Na
Europa, naquela época, o drum’n’bass estava ficando muito cansativo e passado.
Os primeiros lançamentos de d’n’b brasileiro viraram uma febre na Europa, era o
que todo mundo estava precisando, uma nova influência. E foi quando vários
artistas brasileiros explodiram na Europa, como Patife, Marky & XRS
e Drumagick. Como residente do clube e com a minha influência
brasileira, eu queria levar todos eles para tocar em nossas festas. E realmente
todos eles se apresentaram, pela primeira vez, em Viena, em nosso clube.
Music Non Stop – Como foi sua
entrada na produção?
Joyce Muniz – Antes de começar a
produzir as minhas próprias músicas, trabalhei como coproducer e como cantora
para vários projetos e, logicamente, depois de ter a oportunidade de trabalhar
com tantos produtores e artistas – como Stereotype, Richard
Dorfmeister, Sofa Surfers, Munk, entre outros – eu pude absorver
e aprender muitas coisas, o que me deu a vontade de ter o meu próprio estúdio e
produzir minhas próprias músicas.
Music Non Stop – Em pouco
tempo você se tornou uma produtora muito respeitada. Num mercado tão concorrido
como o europeu, você consegue encontrar explicação pra esse boom relativamente
rápido?
Joyce Muniz – Primeiramente,
muito obrigada. Eu acredito que foi uma combinação de vários fatores. Eu nunca
tentei seguir uma moda, o que pra mim foi muito importante e me ajudou a
evoluir o meu som. Eu demorei pra achar o meu estilo. Mas a partir do momento
que eu encontrei a minha própria receita do bolo, eu tive um insight e vi que
aquele era o caminho que eu tinha que seguir. Eu também tive oportunidades de
trabalhar com outros artistas e também remixar vários nomes importantes, como
Blaze, Amp Fiedler, Shonky, Tosca, Dnox & Beckers, Claptone, German
Brigante DJ Hell, Paul Simon… Com isso, eu pude fortalecer o meu estilo e me
diferenciar.
Joyce Muniz – Na verdade, a
música Back in The Days não foi produzida para ser lançada. Eu tenho
uma grande coleção de vinil, uns 3.000 e, muitas vezes, quando eu não me sinto
inspirada, tento encontrar alguma coisa na minha coleção. Nesse dia, em 2012,
por acaso, me inspirei na musica It’s More Fun to Compute.
Passaram alguns meses e eu fui tocar em Londres. Um grande amigo meu, o cantor Rob
Birch (Stereo MCs), apareceu no meu show, junto com o
Mc Bam do Jungle Brothers e me apresentou a
ele. Depois disso, eu convidei o MC Bam para um studio
session em Viena, mas quando ele chegou eu tinha apenas esse beat do Kraftwerk.
Ele pirou com a ideia e já começou a escrever uns textos, e eu disse: “vamos
fazer um vocal em cima, mas não vamos utilizá-lo como beat oficial”.
Nós finalizamos a música e adoramos o resultado,
mas sabíamos que a gente não poderia lançar. Mesmo assim, passei para o meu
manager e publisher. Eles também amaram a música, mas com a situação do sample,
deixamos meio que de lado. Em 2013, recebi uma mensagem na minha página do
Facebook, me perguntando quando Back in the Days seria lançada. Fiquei
muito surpresa ao saber que ele tinha ouvido a música, porque apenas quatro
pessoas no mundo inteiro poderiam ter tocado ela. Perguntei onde ele tinha
ouvido, foi quando ele me passou um link do Boiler Room do
Richie Hawtin praticamente abrindo o seu set com a música. Várias
pessoas começaram a falar sobre e me escreveram perguntando quando ela seria
lançada. Foi quando o meu publisher me escreveu dizendo que ele havia passado a
música para o Richie Hawtin, mas ao mesmo tempo ele disse que a gente não
poderia lançá-la e que não era para eu passar para ninguém. Como o assédio
estava tão grande, ele decidiu tomar as suas próprias providências e entrou em
contato diretamente com o manager do Kraftwerk. Passaram uns
seis meses, até que um dia recebemos um email diretamente do Ralf, dizendo que
ele amou a minha interpretação da faixa e que ele, pessoalmente, iria liberar o
sample para a minha música. Foi assim que tudo aconteceu. Final feliz! Foi
muito gratificante, o pai da música eletrônica gostou do meu trabalho.
Music Non Stop – Quem são
os artistas mais incríveis de quem você era fã e hoje são amigos?
Joyce Muniz – O meu horizonte
musical sempre foi muito aberto. Faz nove anos que eu trabalho para a FM4, que
é uma rádio alternativa, onde eu tenho o meu próprio show. Por trabalhar lá e
ter acesso a tantos gêneros musicais, eu tive a oportunidade de conhecer vários
artistas. Um deles, alguém que sempre me influenciou na música e virou um
grande amigo é o cantor Rob Birch (Stereo Mcs).
O DJ Hell foi pra mim uns dos personagens importantes da cena
de techno/electro, sempre amei os seus sets e fico feliz der ter remixado uma
track de se atual álbum. Umas das mulheres que ganharam uma importância grande
na cena eletrônica em pouco tempo, a Maya Jane Coles, também
virou uma amiga. E também é uma honra ter uns dos bateristas mais foda do
mundo, o Iggor Cavalera, como amigo. Hoje eu divido o estúdio
em Berlim com o DJ T, que também é uma importante
personalidade de música eletrônica. Acho que a amizade entre artistas funciona
quando existe respeito, independentemente da idade e do estilo de música.
Contudo, fico muito feliz de ver amigos da minha geração nos grandes line-ups
do mundo, como: Emanuel Satie, ANNA, Claptone, Kim Ann Fox, Matjoe,
entre tantos outros.
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