Num dos poucos espetáculos que deram nos últimos anos, em 1998, no
Festival Sónar de Barcelona, utilizavam projecções vídeo, animações
infográficas e robôs que se diluíam por entre os músicos. O que mudou desde
então?
Em 2004, temos os Kraftwerk em
versão computador-portátil. Todo o nosso matéria analógico foi reconvertido
para o formato digital e essa é a grande diferença. Até há pouco tempo era-nos
praticamente impossível transportar todo o nosso material dos estúdios
Kling Klang. Era difícil viajar com
tecnologia tão pesada. Hoje, com os portáteis e com a cultura digital, é mais
fácil realizar uma digressão mundial como
aquela que estamos a fazer.
Nos espetáculos desta digressão
têm tocado os temas mais conhecidos. É
isso que irá suceder em Portugal?
Será uma mistura desses temas com
as novidades de "Tour de France Soundtracks". Será uma atmosfera
muito audiovisual, com as projecções sincronizadas com a música. Estivemos na
Escandinávia recentemente e foi maravilhoso! As pessoas entendem a música
electrónica, mas foi óptimo quebrar um pouco mais o gelo... [risos]. Já
passámos pelo Japão, regressámos à Europa e segue-se Portugal. Na era digital,
podemos viajar e tudo funciona na
perfeição.
Mudaram para o digital, mas o
imaginário do último álbum, "Tour de France Soundtracks", mantém-se.
Mais do que um grupo, são um conceito de imagem-som perfeitamente definido, o
que também cria resistências por quem espera que mudem.
O conceito Kraftwerk, tal como
foi definido por mim e por Florian [Schneider] nos anos 70, não sofreu grandes
alterações. É essa a nossa identidade e não a queremos perder, mas isso não
quer dizer que não estamos atentos ao que se passa à nossa volta e que não
tentamos transformar-nos à nossa maneira. A nossa música electrónica tem vindo, gradualmente, a mudar. Está mais
energética e "Tour de France Soundtracks" reflecte isso.
Ao longo dos anos, sofreram
alterações na formação, mas você e Florian Schneider mantiveram-se na liderança
desde 1968. Qual o segredo da longevidade dessa relação?
Já lá vão 40 anos. Somos como
Kling e Klang... [risos]. É um casamento electrónico perfeito.
No último álbum
regressaram ao conceito do ciclismo. Não é propriamente a primeira imagem que
nos ocorre quando imaginamos o futuro. De onde vem esse fascínio?
Adoro andar de bicicleta. As
bicicletas representam energia, progresso sustentado e atento aos valores
humanos, andar para a frente, o entendimento perfeito entre homem e máquina.
Não podemos fazer marcha atrás com bicicletas. Com a música acontece o mesmo -
o que interessa é andar para a frente, estar atento ao tempo e espaço, manter o
balanço certo e encontrar o nosso ritmo.
O ano passado, quando estávamos a
terminar o álbum, tivemos um convite do director da Volta à França para seguir
algumas etapas de helicóptero e no carro oficial. Foi magnífico e permitiu-nos
desenvolver as últimas ideias com total confiança no conceito que estávamos a
desenvolver. Quando o "Tour" terminou em Paris, tínhamos o disco
pronto.
Fala em ritmo e energia, mas nos espetáculos
são conhecidos pelas expressões
impassíveis e pelos movimentos reduzidos ao essencial. É apenas a
música que tem que ser dinâmica?
Ah! Mas nós somos superactivos, emocionalmente
e fisicamente. Estamos completamente despertos, mas a manipulação dos
computadores e dos teclados é muito sensível e não nos deixa espaço para
grandes movimentações. Temos que estar concentrados para não cometer erros.
São um dos grupos mais influentes
da música popular e um dos mais citados pelas novas gerações. Como é que lidam
com frases como os "Beatles electrónicos"? É uma energia muito
positiva que nos é transmitida por pessoas mais novas. É bom chegar aos 50 anos
e, onde quer que vamos, seja a Jamaica ou o Japão, sermos bem recebidos, o que
prova que a música electrónica, apesar das diferentes linguagens, ultrapassa
eventuais diferenças culturais. É uma
forma de comunicação que se impôs, o que, para nós, é um enorme cumprimento.
Quando começámos, no final dos anos 60, estávamos confinados às galerias de
arte ou às universidades e é gratificante vermos como as coisas mudaram desde
então.
O ano passado entrevistámos
Fernando Abrantes, que integrou os Kraftwerk em 1991. Dizia-nos ele que, depois
dos concertos, era comum deslocarem-se a
clubes de música de dança para tomarem contacto com o que se andava a ouvir.
Continuam a fazê-lo?
Sim, depois dos espetáculos,
normalmente existe sempre alguém que nos convida para ir a clubes de música. É
óptimo para praticarmos um pouco da nossa dança robótica e para ouvirmos o que
se anda a fazer. Esperamos que em Portugal alguém nos convide. Recordo-me bem
do Fernando (Abrantes), fez uma digressão conosco, é um excelente músico, e é
muito amigo de um dos nossos engenheiros electrónicos, Fritz Hilpert.
Diz-se que esta será a última oportunidade para
ver os Kraftwerk ao vivo, mas também existe quem diga que irá ser lançado um
álbum ao vivo depois do final da
digressão. Corresponde à verdade ou vão estar mais dez anos parados?
O álbum ao vivo é uma
possibilidade e vamos, sem dúvida, editar mais discos. Em Junho, depois da
última data da digressão, em Moscovo, vamos parar e decidir o que vamos fazer,
mas estivemos tanto tempo sem lançar
nenhum disco, devido ao trabalho de masterização e catalogação do material
antigo, que estamos desejosos de voltar a estúdio para criar material novo.