quinta-feira, 19 de julho de 2018

Peter Zinovieff — O geólogo do som (4 - Janeiro/2016)



Prestes a completar 83 anos, o britânico Peter Zinovieff conta como inventou o sintetizador portátil, que mudou a música de Pink Floyd, The Who, David Bowie e Kraftwerk, e diz que o pop atual é ‘muito repetitivo’

Em 1973, a banda inglês Pink Floyd lançava o álbum “ The Dark Side of The Moon”, cultuado até hoje como um dos discos mais revolucionários da história do rock. Entre os seus atrativos, estavam sons “estranhos” ruídos tecnológicos que pouco tinham sidos ouvidos até então — como a viagem lisérgica que conduz a terceira faixa “On the Run”  repleta de oscilações e desconstruções sonoras. O instrumento que permitiu tais efeitos havia sido usado pouco antes em “Won’t get fooled again”, da banda The Who, também inglesa, com Peter Townshed distorcendo o som do órgão em baixa frequência. 

E seduziu artistas de diferentes gerações como David Bowie, integrante dos Beatles, Led Zeppelin, Kraftwerk, Portishead e Chemical Brothers. Batizado de VCS 3, foi lançado em 1969 pela companhia inglesa Electronic Music Studio (EMS) e é considerado por muitos o primeiro sintetizador portátil do a ser comercializado no mundo. A inovação estava exatamente em sua dimensão — diferentemente dos modelos complexos criados por Robert Moog, que podiam o ocupar uma parede inteira, o VCS 3 era do tamanho de uma maleta.

A inovação surgiu da mente Pete Zinovieff, um dos fundadores da SEM. Filho de russos que imigraram para Londres fugindo da revolução Russa de 2017,ele se formou em Geologia pela Universidade de Oxford. Casou-se aos 27 anos com Victoria, uma jovem que não aceitava as frequentes viagens do geólogo pelo mundo. A saída de Zinovieff foi volta-se para a música, paixão que cultivou durante a faculdade. Inquieto, ele não se contentava com os sons que criava no piano.

— Quando resolvi foca nisso, meu objetivou passou a ser criar sons que não eram possíveis com os instrumentos que tínhamos na época (década de 1960). Meu negócio era experimental, eletrônica. Quase ninguém fazia isso. Criei um estúdio complexo, impensado até então — explica o inglês prestes a completar 83 por telefone, de sua casa em Londres, repleta de computadores e processadores de última geração.

Após algumas demonstrações públicas e concertos improvisados da música eletrônica, o novo produto que custava 330 libras passou a ser cobiçado do por artistas britânicos de rock.

"USO MAIS INOVADOR FOI DO PINK FLOYD"

Para construir o estúdio, Zinovieff comprou antigos equipamentos da Marinha, encheu um cômodo de sua casa de osciladores e amplificadores, e adquiriu o que jura ser o primeiro computador doméstico da história - um PDP-8, modelo industrial que tinha cerca de quatro quilobytes de memória e custaria, hoje em dia, algo em torno de 100 mil libras (financiado pela venda uma tiara que seu sogro tinha dado para a filha). Da necessidade de ganhar dinheiro para bancar seu trabalho como compositor de trilhas e da associação com engenheiros eletrônicos e pesquisadores nasceu a EMS - e o VCS 3.

Após algumas demonstrações públicas e concertos improvisados de música eletrônica, o novo produto, que custava inicialmente cerca de 330 libras, passou a ser cobiçado por artistas britânicos de rock progressivo. Com isso, Zinovieff, até então avesso à música popular - a ponto de ter negado um encontro com Paul McCartney -, foi obrigado a baixar a guarda. E passou a receber artistas como Ringo Starr, David Gilmour, Roger Waters, David Bowie e Karlheinz Stockhausen.

— Eu não ensinei nada a esses caras. Assim que eles começaram a experimentar meu sintetizador, eles imediatamente superaram qualquer coisa que eu poderia lhes ensinar. Por isso, são geniais. Eles tiveram o feeling e souberam tirar daquilo o que queriam. E também é por isso que os efeitos que o sintetizador causou em suas canções foram tão diferentes entre si — conta Zinovieff, que não titubeia quando perguntado sobre a banda que melhor soube usar sintetizadores em sua obra. — Pink Floyd, sem dúvidas. Eles usaram a máquina da maneira mais inovadora possível, e fizeram músicas extraordinárias que ninguém tinha escutado até então. Dos artistas mais novos, o Portishead também faz um bom trabalho.

Como todo inventor, o senhor de humor tipicamente inglês já foi rotulado de "louco" algumas vezes. Como quando o falecido Jon Lord, ex-organista e tecladista da banda Deep Purple, visitou seu elaborado estúdio e o viu discutindo com o computador e esperando uma resposta. E é com orgulho que Zinovieff conta da vez em que, ao lado do compositor Harrison Birtwistle, ex-diretor do Royal National Theatre, escalou o Big Ben para gravar um sample do barulho do relógio.

— Em 1971, eu e Birtwistle estávamos trabalhando numa composição chamada "Chronometer '71", basicamente distorções eletrônicas do barulho de relógios, e a maior parte da trilha é gravada no Big Ben. Escalamos até o topo da torre e botamos microfones em qualquer mecanismo que fosse possível. Deu um grande trabalho conseguir aquela autorização, mas foi uma ótima aventura — diverte-se.

"O TECLADO É O DEMÔNIO PARA A MÚSICA"

A música é uma das faixas do álbum "Electric Calendar/The EMS Tapes", uma retrospectiva de experimentações feitas entre 1965 e 1979 (ano em que a EMS declarou sua falência) que Zinovieff lançou em julho do ano passado. Por falar em sample, o inglês alegou, em recente entrevista ao jornal britânico "The Guardian", que também é o criador do processo de sampling:

— O que eu quis dizer é que fui o primeiro a usar samples em um computador. Com certeza, outras pessoas já tinham gravado sons aleatórios antes, mas nunca tinham organizado-os em uma máquina a fim de criar músicas a partir disso.

A falência da empresa e a consequente venda de seu estúdio ("o pior momento da minha vida", lembra) fizeram Zinovieff passar os 30 anos seguintes sem compôr músicas. Nesse meio tempo, virou professor universitário e estudou design gráfico. Mas, incentivado por um fã músico, que encomendou uma de suas trilhas, voltou a se dedicar à arte em 2010, construindo um novo estúdio hi-tech. Ele reconhece que é saudosista e, por isso, segue sem gostar de música pop:

— Hoje em dia, tudo é muito fácil. Qualquer um compra programas de edição e pode fazer música. Somos constantemente bombardeados por música ruim. Eu ligo a televisão e me desespero, diariamente. E é por isso que eu nunca quis que botassem um teclado conectado a um sintetizador.

O teclado é como um demônio para a música, porque ele tornou tudo muito preguiçoso. Vamos dizer que você queria adicionar flauta em uma música que está criando. Como as pessoas têm feito isso? Elas pegam o teclado e emulam o som. Elas não tocam mais a flauta, por pura preguiça. O teclado e suas facilidades têm afastado o lado orgânico da música. Tudo virou repetitivo.

É por isso que bandas como Pink Floyd, Rolling Stones e Led Zeppelin seguem ganhando milhões em turnês pelo mundo. As pessoas sabem que elas ainda soam originais, diferentemente de muita coisa produzida por músicos atuais.





terça-feira, 17 de julho de 2018

domingo, 8 de julho de 2018