Ralf Hütter – Acho que foi a chegada dos primeiros sintetizadores monofônicos, porque antes disso só existiam aquelas grandes máquinas dos Laboratórios Bell ou de estações de rádio estatais. Ter acesso, como músico individual e independente, a esse tipo de equipamento eletrônico foi uma revolução. Lembro que o primeiro sintetizador monofônico que comprei custava o mesmo que um Fusca, e essa era a escolha a ser feita. Acho que é uma comparação excelente, porque os sintetizadores deram liberdade de movimento aos músicos.
Future Music – Essas máquinas oferecem mais liberdade do que as de hoje por não terem presets?
Ralf Hütter – Sim. Você recebia apenas um manual datilografado de três páginas dizendo: “isso é o oscilador, isso é o filtro” – e só. Então você ia pra casa e começava a experimentar, girar botões. Não havia sons pré-programados, porque era tudo analógico. Eu não uso muito os sons pré-programados de hoje em dia; se usamos, sempre trabalhamos em cima deles. Raramente mantemos algo que veio do ouvido de outra pessoa. Sempre giramos os botões – essa tem sido nossa prioridade constante. Também costumávamos projetar nossos próprios sintetizadores e, naquela época, tínhamos que construir sequenciadores porque eram raros. Só os grandes sistemas Moog os tinham. Pegávamos caixas de ritmos e as redesenhávamos com nossos engenheiros e eletricistas para torná-las tocáveis, ajustando-as aos sequenciadores e depois sincronizando tudo com fita.
Future Music – Como o Kraftwerk consegue transferir sua música para o formato ao vivo?
Ralf Hütter – Não é pré-gravado, está tudo em armazenamento digital. Não usamos fitas, tudo roda a partir de computadores. Podemos alterar o quanto quisermos: cortar faixas, mutar, dobrar... Temos acesso completo. Podemos deixar qualquer faixa mais longa, de acordo com o show. Certas partes são escritas, mas algumas composições começam em um ponto e ficam totalmente abertas, com a programação entrando em um loop. Podemos fazer o que quisermos. Todas as composições (com exceção de The Robots) são escritas como sequências básicas.
Future Music – Você se surpreende com o quanto influenciaram a música dance americana?
Ralf Hütter – Sim, mas sempre tivemos uma resposta muito favorável do público negro nos EUA, mesmo antes do house e do techno. Lembro que alguém nos levou a um clube por volta de 1976 ou 1977, quando Trans-Europe Express havia saído. Era um loft em Nova York, depois do horário, justamente quando a cultura dos DJs estava nascendo e eles começaram a fazer seus próprios discos e grooves. Um DJ estava tocando trechos de Metal on Metal do Trans-Europe Express, e pensei: “Ah, estão tocando o novo álbum.” Mas aquilo durou uns 10 minutos! E pensei: “O que está acontecendo?!” A faixa original tinha só uns dois ou três minutos! Depois perguntei ao DJ e ele me disse que tinha duas cópias do disco e estava mixando as duas – e claro, podia continuar enquanto as pessoas dançassem. Isso foi um verdadeiro avanço, porque naquela época você tinha que fixar um tempo máximo por lado do disco, menos de 20 minutos, para que coubesse no vinil. Era uma decisão tecnológica que definia a duração da música. Sempre tocamos com durações diferentes ao vivo, mas ali estávamos, num clube alternativo, com a gravação rolando por 10, 20 minutos – e a vibração estava lá.
Future Music – E como os outros ex-integrantes veem a influência duradoura do Kraftwerk?
Karl Bartos – Não sei. Eu faço música, seja ela boa ou não tão boa. Faço o meu melhor e deixo o público decidir. Se Andy, Johnny ou Bernard dizem isso sobre nós [neste caso, OMD e Electronic elogiando o Kraftwerk – Ed.], é muito lisonjeiro. Tenho orgulho do que fizemos, mas sempre que posso gosto de improvisar, me comunicar. Quero encontrar pessoas, não ficar num estúdio atemporal ou numa torre de marfim – já fiz isso por 15 anos!
Wolfgang Flür – Talvez seja verdade que fomos algum tipo de ponto de referência na música eletrônica...
Future Music – E quanto ao estúdio Kling Klang? Como ele mudou?
Ralf Hütter – Nós o chamamos de jardim eletrônico, porque ele está sempre se regenerando e agora é completamente modular, de forma que podemos trocar e substituir módulos conforme quisermos. Mantivemos todos os nossos sintetizadores antigos guardados e, embora tenham perdido valor quando foram superados, hoje temos todos esses equipamentos analógicos de volta! É realmente muito bom. Mudar para o digital de forma alguma substituiu o analógico, especialmente porque, muitas vezes, a tecnologia digital é usada apenas para amostrar fontes analógicas – seja remasterizando sons antigos das fitas originais ou de outras fontes sonoras. Sempre consideramos qualquer fonte de som – é apenas som. Kling Klang significa “som” em alemão, então sempre tivemos essa fascinação por som.
PS: As entrevistas foram feitas separadamente =)
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